segunda-feira, 11 de junho de 2012

Comunicado do Comando Local de Greve - n. 02

Porque estamos em greve?
COMUNICADO  Nº 002
Greve Docente na UFG
Comando Local de Greve de Goiânia
11/06/2012

1.      A carreira docente defendida pelo governo

Ingresso:  todos passam a ingressar como auxiliar, independente da titulação, o que significa 24 anos para alcançar o topo da carreira, se não concorrerem condições especiais.
Avaliação:  a progressão se dará por meio de “avaliação de desempenho, de acordo com diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Educação e Ministério da Defesa” — ou seja, esses ministérios terão a prerrogativa de prescrever a forma como seremos avaliados, sem nossa interferência.
Ensino e pesquisa:  docentes não vinculados a programa de pós-graduação há pelo menos dois anos não poderão progredir até a classe de associado — ou seja, teremos uma discriminação na carreira, separando na classe de Associado os docentes “de elite” e bloqueando o ascenso dos demais.
Aulismo:  a progressão poderá ser acelerada na mudança entre níveis de uma mesma classe se o professor assumir carga horária igual ou superior a 12 horas semanais de aula na graduação.
Aposentados:  não há previsão de reenquadramento dos docentes que se aposentaram antes da criação da classe de Associado e que ficaram presos em níveis inferiores da carreira.
Vencimentos:  a remuneração será composta de Vencimento Básico e Remuneração por Titulação, com a Retribuição por Titulação em valores nominais, o que significa que os eventuais reajustes incidirão automaticamente apenas sobre uma parte do salário.
Carreira dupla:  a manutenção da classe de titular como pertencente a outra carreira traz prejuízos importantes na aposentadoria.
“Gorjeta”:  o docente que realizar projetos de pesquisa e extensão com captação de recursos próprios e compatíveis “com a política da instituição para atividades de pesquisa e extensão e com o plano de desenvolvimento institucional” poderá receber uma Retribuição por Projetos. O professor talvez receba um “por fora”, mas o Estado não financia e quem pauta o projeto é a instituição!

2.    O futuro do trabalho docente: competição, intensificação, hierarquização e controle externo

Essa carreira que o governo tenta nos impôr, é fácil ver, divide a categoria, separando da massa dos docentes uma minoria de privilegiados que, tendo fontes externas de recursos e adaptando-se às políticas institucionais, consegue acesso à Retribuição por Projetos, ou que, atuando na pós-graduação, consegue galgar até o topo da carreira — convém lembrar que não há pós-graduação em todos os luga­res, e nem espaço para todos os docentes nos programas existentes de pós-graduação.  O que estabele­ce uma hierarquia, mediante a qual os professores com projetos institucionais e os da pós-graduação tenderão a desobrigar-se de certas funções menos “nobres” para concentrar-se naquelas de que lhes advém sua vantagem pecuniária sobre os demais.  Todo esse processo tenderá a estimular a competi­ção, em mais de um terreno.  Um deles será o do empreendedorismo — o docente que captar mais recursos terá mais chances de concorrer pelos Projetos Institucionais.  Outro será o da avaliação de desempenho.  É bem conhecido nosso o modelo de desempenho da CAPES, baseado em medidas dire­tas de quantidade, não de relevância nem de qualidade.  A adesão a esses critérios tenderá, no entanto, a favorecer o docente em sua carreira — com o tempo veremos a naturalização das políticas produti­vistas e do regime de trabalho intensificado que ela institui.  E o que restará àqueles de nós que não nos enquadrarmos na elite?  Tenderemos a recorrer ao caminho da progressão acelerada pelo recurso de aumentar a carga horária de aulas na graduação.  O resultado previsível é o desenvolvimento gradu­al de duas espécies de professores no ensino superior público: os professores pesquisadores, com car­reira de quatro classes e adicionais decorrentes de projetos, e os professores aulistas, com carreira de três classes e mais nada.
Ao lado disso assistiremos a perda de nossa autonomia tanto na definição dos critérios pelos quais devamos ser avaliados, quanto na definição dos objetos e problemas de nossa pesquisa, já que, para ao menos concorrer à Retribuição por Projetos, teremos que a enquadrar nos moldes definidos de maneira centralizada pelas instâncias administrativas da instituição.

3.    A universidade por trás da carreira

Que será de uma universidade cujos princípios fundamentais sejam o empreendedorismo, a mercantili­zação do conhecimento e o produtivismo?  Os critérios definidos para a carreira docente no projeto do governo criarão de saída duas classes de instituições universitárias federais: as de ensino e as de pesquisa.  Com efeito, nos campi do interior ou em instituições de regiões mais distantes dos grandes centros, onde os programas de pós-graduação são escassos, a maioria dos docentes, para acelerar sua carreira necessariamente limitada, tenderá a intensificar sua atuação no ensino de graduação.  Com isso estará morto o princípio constitucional da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, e consolidada a especialização das IFES em “centros de excelência”, de um lado, e, de outro, “escolas terciárias”.
Essas tendências que para nós parecem inaceitáveis, estão, entretanto, perfeitamente alinhadas com o modelo de reestruturação das universidades implantado através do REUNI.  Aí a lógica de gestão é produzir o maior número possível de diplomas com o menor custo possível.  Por isso a expansão se deu com a previsão de um número médio de professores por aluno insuficiente — tipicamente 12 docentes para cada curso novo.  A execução do projeto do REUNI está, portanto, associado a um processo claro de intensificação do trabalho docente, em que o professor passa paulatinamente a se concentrar no ensino, na certificação de estudantes e na apresentação de índices de desenvolvimento institucional meramente quantitativos.
Trata-se de uma expansão precária do ponto de vista do trabalho, mas também das condições de traba­lho, inclusive de infraestrutura.  Salas de aula, laboratórios, bibliotecas, salas de professores, infraes­trutura administrativa, entre outras, são instalações importantes, cuja precarização também caracteriza o atual momento de agravamento das condições da atividade docente nas IFES, sobretudo nas do interior.
Por aí se vê que a discussão da carreira docente não diz respeito apenas aos professores e a sua vida profissional — ela está diretamente ligada à construção do futuro da universidade pública brasileira, da qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão.  A carreira que nos querem enfiar goela abaixo comprometerá o desenvolvimento de uma educação superior pública de qualidade, subordinando de forma intensiva e extensiva a atividade docente a lógica do mercado.  Essa subordinação aniquila a função social que historicamente a universidade pública vem desempenhando entre nós, e que é tão necessária nesse país com tantos desafios e tantas desigualdades.
Comando de Greve

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